sexta-feira, 1 de junho de 2012

José do Patrocínio e seu automóvel


    Quando José do Patrocínio, o famoso abolicionista, retornou de uma viagem a Paris, trouxe na bagagem não apenas livros e champanhes de qualidade, mas uma ideia com a qual ele imaginava que iria enriquecer da noite para o dia. Aos amigos mais próximos, confidenciou o segredo que o tornaria rico:
“Trago de Paris um carro a vapor... O veículo do futuro, meus amigos. Um prodígio! Léguas por hora. Não há aclives para ele: com um hábil maquinista, vai pelo Corcovado acima como um cabrito.”
    O carro era um verdadeiro monstrengo e só para retirá-lo da alfândega foi um transtorno. Após conseguir montá-lo (tinha fornalha, caldeira, chaminé, correntes, grelha e ganchos), Zé do Pato, como Patrocínio era conhecido, marcou uma manhã de domingo para dar o primeiro passeio. Chamou diversos amigos a fim de andarem no automóvel, mas apenas o poeta Olavo Bilac teve coragem e aceitou o convite. Ao verem aquela máquina desengonçada, soltando bufos horrendos, cuspindo fumaça e fuligem para todo lado, deslizando pesadamente pelas ruas pacatas da cidade, como se fosse explodir a qualquer momento, as pessoas passaram a fugir dela como o diabo da cruz. O carro de José do Patrocínio foi também o responsável pelo primeiro acidente automobilístico que se tem notícia em terras fluminenses, pois colidiu com diversas árvores pelo caminho, a pouco mais de dez quilômetros por hora, até que acabou atolado em uma vala, sendo preciso inúmeros bois para conseguir retirá-lo dali. O sonho de Patrocínio de enriquecer com a novidade acabou naquele mesmo dia. Anos mais tarde, o escritor Coelho Neto chegou a ver o que restara do automóvel e disse que em suas fornalhas estavam dormindo galinhas. Por fim, foi vendido para um ferro-velho. 


Panhard Levassor produzido por volta do final do século XIX em Paris, provavelmente José do Patrocínio teria adquirido um modelo destes.




3 comentários:

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  3. Boa Noite, Sr.Martino

    Estou pesquisando sobre a vida de José do Patrocínio, para realizar uma exposição. Atuo em um Programa de Difusão Cultural. Tenho lido algumas dissertações de mestrado e doutorado a respeito do abolicionista. Li,recentemente,um artigo em que ele responde, em seu jornal, à crítica daqueles que lhe chamavam de "papa-pecúlios", pois estranhavam que ele,com dificuldades financeiras,tenha conseguido montar um jornal e viajar à Europa("Perguntam-me como vivo e de que vivo e têm razão. Quem sabe que eu sou filho de uma pobre preta quitandeira de Campos deve admirar-se de me ver hoje proprietário de um jornal e de que eu pudesse fazer uma viagem à Europa).
    E, então, Patrocínio dá prosseguimento ao artigo, justificando-se... .
    Depois, em um site sobre a história dos automóveis no Brasil, coincidentemente, descobri que o primeiro acidente automobilístico brasileiro tinha ocorrido com veículo que lhe pertencia, ao tentar ensinar a Olavo Bilac como conduzi-lo. Mesmo com as justificativas do artigo do jornal, fiquei admirada como José do Patrocínio conseguiu adquirir um carro àquela época... o 2º automóvel do Brasil!!! O 1º, quem o trouxe foi Santos Dumont. Ambos os veículos, vindos da França. Com certeza,foram bem caros. Ainda que já sabedora dos fatos, eu adorei ler teu texto, Sr. Martino, pois escreveste com riqueza de detalhes e com uma jocosidade saborosa, que agrada ao paladar dos leitores. Parabéns!!!

    Rita Brígido
    Blog: Da Pulsão de Ler e Escrever
    (ritabrigido.blogspot.com.br)

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